segunda-feira, setembro 10, 2001

Estive pensando no que um amigo disse ontem após ler as besteiras que posto... E de novo Admirável Mundo Novo me vem à baila... A famosa cena em que uma ilha era oferecida às pessoas que gostavam de “pensar diferente”, onde se encontraria tudo que eles necessitavam. Huxley teria pensado em Avalon, na Ilha dos Bem-Aventurados, o “céu” dos católicos, qual delas? Todas? Comum a todas é a idéia de “provas” terrenas preparando o caráter do “herói” para ir viver num lugarzinho melhor, perfeito, livre de todas as suas penas, recompensado por todas as aporrinhações que teve nesta vida. De qualquer forma, “rebeldia” na Internet soa mesmo como um novo tipo de conformismo, uma fuga da realidade. A verdade é que, no dia-a-dia, isso não me satisfaz nem me consola. Estou longe, muito longe disso. Gostaria de ser, não sou, sinto muito. Não consigo me conceber abandonando uma noite de lua para ficar horas teclando na frente do computador ou deixar de sentir o calor do sol. Esses pequenos idílios me fazem sentir viva. A vida passa muito depressa e a minha é solitária por excelência. Nascemos sós e morremos sós, verdade, ninguém pode penetrar nossas mentes e nossas almas. Mas talvez alguns dentre nós se sintam mais solitários que os outros. Andei procurando os consolos que a sociedade oferece a gente como eu, de bom grado, até. Mas não encontrei até agora lugares onde as pessoas tocassem no que vai na alma. São lugares para ajudar as pessoas a olharem para a superfície dos erros que cometem, o que busco é algo que possa curar a ferida feita a punhal em minha alma. E normalmente as pessoas têm um véu sobre os olhos, talvez até por questão de sobrevivência, fazendo com que seus problemas as tornem cegas e egoístas: “o meu problema é o pior do mundo; todo mundo têm problemas”, frases que me irritam. Conheci pessoas que achavam que uma dor de cabeça que sentissem era mais grave do que a dor que você sentia após ter perdido um filho. Egoísmo, quando não é questão de preservação, me irrita profundamente. Só que isto vem da mesma mente que acha que viver uma vida se privando e cedendo sempre aos outros é uma merda. Ah, minhas pequenas contradições. E volto a dizer que melhor do que equilíbrio, a resposta para estas questões é sincronicidade.

Andei pensando naquela história das ovelhas. Por isso que política no Brasil é esta merda. Numa sociedade em que os únicos líderes que são ouvidos ensinam às massas populares que elas devem gostar de ser “ovelhas” pois só sendo comandadas por alguém (mesmo que seja Jeová ou Jesus ou o pastor bonitão, afinal pastor é um padre que come sem transformar ninguém em mula-sem-cabeça, muito mais apetecível) elas podem querer ser felizes e almejar o reino dos céus... Quanto mais aumenta o número de comandados por essa turma, mais despontam candidatos políticos evangélicos. Com um argumento como esse, com uma massa de miseráveis dizendo “amém” às suas lavagens cerebrais diárias, eles até eu estão demorando. Até agora só elegeram um governador (que eu saiba, não sei de outros estados). O que vai ser quando eles finalmente conseguirem conquistar toda a massa de miseráveis, desesperados e oprimidos? Muitos espertos já se “converteram”, porque sabem que o futuro está ali. Até já posso ver uma nova Inquisição, em Maricá uma vez disseram ao “rapaz bonzinho que ajudava com as bolsas” sem saber quem ele era (meu ex)que iriam se reunir para exorcizar a “casa do diabo” que tinha o símbolo do demônio (um pentagrama) sobre o batente da porta (por acaso a nossa casa). Dois ou três mais agressivos já vieram ME perguntar se eu sabia o que era a estrela que EU carrego no peito. EU me pergunto se essas pobres ovelhas sabem que as coisas nesta vida vão além das vendas que elas colocaram nos olhos por vontade(?) própria. Mas há dias em que fico preocupada: já vi gente inteligente, capaz de raciocínio, de repente ao se tocar numa palavrinha mágica (digamos, uma discussão sobre a Bíblia) simplesmente deixar de raciocinar, de EXISTIR e dar lugar a um discurso inflamado e fanático que não parece sequer estar saindo de sua boca; essas pessoas viram uma espécie de autômatos, “possuídos” por uma programação mental fortíssima, repetindo a ferro e fogo palavras que já ouvi saírem iguais, exatas, nas mesmas palavras, das bocas de outros “crentes”. E eu, que sou louca assumida, conheço melhor do que ninguém aquele brilho sinistro no olhar deles, aquela fúria, que sempre me assusta. Nessas horas as “ovelhas” viram soldados de Cristo. O que esses caras estão planejando? Já não basta perpetuar preconceitos e tabus. Algo ainda vai acontecer.

Aí direis: mas e você? Você não é a mesma que vai lá, dançar nas boates com eles a música alienante de letras imbecis? Sim, mas eu uso a música das ovelhas para fazer mágica, seu espaço profano para promover minha katabasis. Além do mais, não é privilégio dos lobos beijar bem. Eu fico com ovelhas, sim, por vezes até vou para a cama com elas, só que elas não sabem se despir de seus preconceitos e dos seus medos. Agora, amar e namorar de verdade, não apenas me apaixonar por achar bonitinho e ficar junto por um tempo, só consigo realmente pelos lobos. É que limitações me irritam. Até aí, conheci lobos que no fundo queriam ser ovelhas. Hehe, talvez fossem apenas ovelhas revoltadas. Ovelhas em pele de lobo, há! Mas existem.

Às vezes me sinto como na história do Patinho Feio, só que numa versão mais psicodélica. Eu fui criada ouvindo de crianças no colégio em que estudei que eu era maluca por ser inteligente demais. Eu era uma coisinha dentuça, de óculos (que eram constantemente quebrados pelos meus “amiguinhos”), rabo de cavalo (não gostava de pentear o cabelo desde pequena) e roupas maiores do que o meu tamanho, “pra economizar porque criança cresce rápido”(deve ser por isso que fico com raiva quando dão roupas pro meu filho para uma criança com o dobro da idade dele, trauma :-)). Hoje sou considerada não apenas inteligente, como descobri que posso ser bonita. Ainda lembro dos meus quinze anos, quando empombei com a minha mãe querendo comprar a centésima calça semi-bag para o colégio e comprei uma jeans justíssima, do tipo que mostra até a marca da calcinha na bunda. Passei a andar sem os óculos também, já querendo trocá-los por lentes. E de batom. O pessoal no colégio caiu pra trás. Eu me lembro, divertida, disso até hoje. Foi estranhíssimo! Os meninos, que até então costumavam me seguir pra gritar que eu era maluca passaram a me seguir porque descobriram que eu tinha bunda :-)

Uma das coisas que me entedia hoje em dia é que os filhos dos homens que deitaram com Leila Diniz são tão ou mais preconceituosos que os homens daquela época. Fizeram a revolução sexual para minha geração conhecer o sexo com camisinha, mas as cabecinhas (de cima) continuam com mentalidade de idade das pedras. (A de baixo continua se metendo em qualquer coisa que aparece na frente, desde que seja úmida e quentinha) Parece que vivemos no seriado Caras e Caretas, só que os Caretas hoje se fazem de “cool”. Não importa a maquiagem que eles vestem, se são maconheiros hippies ou mauricinhos evangélicos, no fundo todos pensam igual a seus avós. Ugh.

Dúvida cruel: Ipanema ou Monjolos? Marisa Monte ou “Entornáveis”? Por via da dúvidas, e embora Ipanema não seja Botafogo, pra ambos os lugares não levarei celular, documento ou bolsa, muito mal o dinheiro da passagem. Sabe lá? Viver sem o tijolão da Ericsson já foi difícil, como vou viver sem o meu Talkabout lindinho?

Aparentar futilidade é um dos melhores disfarces para a subversão.

Falar em camisinha, taí uma coisa que me irrita com a invenção da AIDS: a obrigatoriedade que minha geração sente em usar camisinha. O contato mais íntimo que possa existir entre dois seres humanos, na verdade é roubado. Sua pele na minha, sua semente no meu corpo, pode me matar. E logo eu, que sou “bicho dadeiro”, fui nascer pra ser mulher depois da década de 90... Claro que não quero me matar em troca de um pouco de prazer a mais, mas bem que podiam liberar logo a cura pra essa doença maldita ao invés de ficarem aí, fazendo jogo de que não existe cura pra lucrar mais com isso... Remédio caro, controle de natalidade, um certo tom dramático, controle dos hábitos sexuais de toda uma população, verba para pesquisas medicinais... Realmente é lucrativo demais para liberarem a cura, não? Os heróis do Cazuza morreram de overdose, os meus, alguém soropositivo bem posicionado matou. Pagamos o preço de nossa fragilidade, de nossa solidão. Somos tão fáceis de manipular...


Engraçado, ultimamente Acima do Sol do Skank parece que tem sido escrita pra mim. História da minha vida. Mas será que existe alguém assim?

Alguém aí lembra de um filme com a Goldie Hawn e o Stevie Martin em que ela vive uma mentirosa contumaz que simplesmente decide ir morar na casa que ele construiu para a mulher com quem queria se casar e ele se vê envolvido com todas aquelas mentiras, mas acaba se apaixonando e pra provar que a ama, quando ela vai embora, ele começa a mentir também para ficar com ela? Eu vivi sete anos assim, sem saber o que era real ou inventado na pessoa com quem eu vivi. Onde começava o homem, onde terminava o escritor? Chegou a um ponto em que até mesmo a maneira com que ele me traiu virou mais uma história, sem se distinguir os detalhes reais e imaginários. Porque não se pode apenas pegar a realidade nua e crua e contá-la de forma interessante? Uma vez ele começou a contar um fato que eu tinha presenciado, com detalhes absurdos, e ainda pediu minha confirmação. Sorri amarelo. Porque inventar, se a história era legal? Será que ele um dia soube que muitos amigos dele riam pelas costas dos detalhes inventados de suas histórias, que consideravam aquilo coisa de quem está desesperado pra chamar a atenção? Irônico, porque se eu falasse sobre isso, ele diria que saiu da minha boca. Irônico, porque ele dizia que EU era louca pra chamar a atenção. Toda vez que ainda ouço alguém falar isso, me parte o coração. Ah, será que essas coisas um dia vão mudar?
Será que EU vou conseguir me transformar em alguém melhor?