Eu acho que um dos meus grandes problemas é ser sensível demais, num nível muito mais idiotamente profundo que a maioria das pessoas. É como se fosse uma espécie de hemofilia emocional. Eu não tenho defesas.
A maioria das pessoas se corta, sente alguma dor, sai algum sangue, coagula, cicatriza e pronto. Um hemofílico pode sangrar até morrer. Eu sou mais ou menos assim: um tapa na cara, um corte na alma bastam para me arrancar do estado fugaz de estabilidade que persigo tão tenazmente e me fazer mergulhar de novo, lutando contra o velho nó na garganta, no meu estado depressivo corriqueiro... olá dona melancolia, como tem passado? Mal? Eu também. Vamos dar a mão e passear pelas sombras, nos isolar do mundo e finalmente, quando não for mais possível aguentar, lutar contra aquelas duas lágrimas doloridas e o choro abafado no travesseiro, na escuridão do quarto e na incandescência impiedosa dos pensamentos.
Mas há sempre um dia seguinte, e eu luto para vencer a manhã típica que qualquer pessoa depressiva conhece bem, ao longo do dia cuido da minha vida, luto contra a dispersão, tento criar, tento trabalhar, tento amar e esquecer a noite anterior. Posso mesmo ter uma sequência de dois a três dias de uma rotina razoavelmente estável, e até ter esperanças de conseguir viver assim. Faço planos. Até que algo acontece (sempre algo acontece!) que não aparenta ter nenhuma importância para as outras pessoas envolvidas, mas que me arrasa por dentro até o ponto mais profundo da minha alma.
A minha notória incompetência no trato com o outro somada à minha sensibilidade exarcebada garante que o meu humor oscile mais ao longo do dia que a cotação da bolsa... Vivo na eterna armadilha de estar presa entre duas situações: ou fico em casa e me isolo do mundo, mas acabo enlouquecendo por perder a independência e pelo excesso de solidão, ou saio na rua e vou à luta tentando desviar das porradas ou me forçando a fazer o que esperam de mim. Tudo que sei é que me debater nessa teia por tantos anos só me tem feito ficar a cada dia que passa mais cansada e tenho descoberto, para meu desgosto, que estou ficando um pouco amarga com a idade. Mas paciência. Preciso acreditar que faz parte da vida. Não vejo outra escolha na minha frente.