segunda-feira, março 31, 2003

Ela está sentada no parapeito da janela. Meia-noite. Madrugada adentro. Uma brisa suave escorrega sinuosa por sobre sua pele e percorre delicadamente o veludo negro do vestido longo. Prata adorna suas orelhas, uma fita de veludo em seu colo ostenta a estrela de cinco pontas, simbolo de sua devoção, banhada suavemente pelo luar nascente... Olhos penetrantes, de cílios longos e íris de mel escuro, se perdem na contemplação do mundo além da penumbra do quarto... A linha dos lábios se ergue serena e altiva, lábios carnudos de fruta madura, de toque suave e macio. Todas as palavras que se enunciam brevemente no pensamento não ousam irromper por entre eles e perturbá-los em seu repouso, apenas o leve sopro vindo do nariz altivo vem brincar por sobre eles, namorando seus contornos bem definidos. A brisa passeia entre os cabelos soltos, ondulados, revelando um reflexo rubro sob a tenra luz desse luar... Nesses momentos secretos, de suave melancolia e absoluta solidão, ela se deixa vaguear por lembranças e histórias, e observa enquanto o frescor da noite penetra por todo seu ser, e tenta adivinhar o futuro, as noites que ainda estão para ser... Bela e triste, imersa em pensamentos... distante em seu momento de sombra serena, um tanto oculta na penumbra do quarto, um tanto revelada pela luz suave, namorando a fumaça perfumada do cigarro agora aceso, observando calmamente enquanto esta sutilmente parece dar forma a seus devaneios... Cicatrizes na alma, meu amor, todos nós temos.